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“Agora que estamos vivas, o que a gente pode fazer?”. A pergunta que Aisha Lemos faz a si mesma carrega o peso e a beleza de uma trajetória construída entre a resistência e o gesto de criar. A artista potiguar e articuladora cultural é uma das finalistas do Prêmio Inspirar 2025, iniciativa nacional do Instituto Neoenergia que, pela primeira vez, celebra exclusivamente mulheres negras que transformam comunidades por meio da arte e da cultura.
Aisha concorre na categoria Coletivos com o projeto Femme Queen Sensation, movimento potiguar voltado ao fortalecimento e à visibilidade de mulheres trans e travestis na cena Ballroom. Aisha representa o Rio Grande do Norte na premiação, que tem votação popular aberta até 10 de novembro. Vote aqui.
Da necessidade ao reconhecimento
“Muitas vezes a gente faz alguns movimentos por necessidade”, conta Aisha. “Produzir cultura, unir as travestis aqui na cidade é uma questão de sobrevivência.” Foi dessa urgência que nasceu o Femme Queen Sensation, criado por ela junto de Overall Princess Hiura Baixíssima e Mother Vitoria Um Milhão de Acúenda. O coletivo se tornou um espaço de afeto, segurança e aprendizado para as travestis e mulheres trans da comunidade Ballroom potiguar, promovendo treinos, rodas de conversa e ações de acolhimento, como distribuição de cestas.
O reconhecimento na premiação, diz Aisha, veio como surpresa:
“Quando esse prêmio vem, quando vem esse reconhecimento de pessoas de fora do Estado, me pega num local de muita surpresa. A gente constrói isso por necessidade, não necessariamente para se tornar uma grande referência, só porque a gente precisa estar viva.”
Para ela, estar entre as finalistas é um sinal de que a luta tem dado frutos:
“Essa luta que a gente faz para se manter viva também pode ser referenciada. Esse prêmio significa muito esse local de passar a existir, de não ter mais esse medo de estar só à margem, mas de ocupar também o lugar da produção”, relata.
O coletivo que transforma o corpo e o território
O Femme Queen Sensation surgiu a partir de um incômodo: a ausência de visibilidade das Femme Queens, mulheres trans e travestis que atuam nas Balls, competições artísticas e performáticas da cultura Ballroom. Inspirado em outras organizações do país, como o The Femme Queen Experience (SP), o coletivo nasceu para “marcar o território” no Rio Grande do Norte, criando espaços seguros e afetivos para corpos dissidentes.
Aisha explica que o objetivo é construir uma rede de apoio e valorização da presença travesti na cultura local:
“A gente passa a ter esse reconhecimento de que pode estar viva não só no local da sobrevivência, mas no local da produção. A gente pode estar movimentando outras pessoas, incentivando outras travestis que passam pelas mesmas coisas.”
Hoje, o Femme Queen Sensation já expande suas ações para João Pessoa e Recife, sinal de que o movimento potiguar começa a inspirar outras cidades do Nordeste. “Ser reconhecida como uma liderança que movimenta uma cidade e uma cultura é muito significativo. Mostra que o que a gente faz tem sentido, tem propósito”, reflete Aisha.
Com o tema “Ciclo Infinito Inspirar”, a edição de 2025 da premiação celebra o protagonismo feminino como força transformadora. O ciclo simbólico: inspirar, criar, resistir, realizar, empoderar, multiplicar, encantar, sonhar, se conecta diretamente à história de Aisha e das travestis potiguares que, a cada passo, ressignificam a presença de seus corpos no campo da arte e da política cultural.
“Após a premiação, a gente vai ter um encontro com todas as pessoas premiadas. Isso vai ser muito rico para a nossa cidade, para a nossa comunidade. Eu quero trazer esse aprendizado para as minhas irmãs, para os meus irmãos, para democratizar o acesso, para os nossos corpos travestis e para toda a cidade”, conta.
“A cultura não abraça só o corpo travesti ou LGBT. A cultura é movimento político, é o que faz a gente se conscientizar. Ver o resultado desses movimentos é muito gratificante.”
Sobre o Prêmio Inspirar 2025
Apresentado pelo Ministério da Cultura e pelo Instituto Neoenergia, o Prêmio Inspirar 2025 distribui R$ 169 mil em recursos para iniciativas lideradas por mulheres negras em duas categorias: Mulheres (R$ 10 mil cada, para 13 lideranças) e Coletivos (R$ 13 mil cada, para três iniciativas). A cerimônia de anúncio das vencedoras acontece no dia 27 de novembro.
O prêmio está alinhado aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) 5 – Igualdade de Gênero, da Agenda 2030 da ONU, e reconhece mulheres que transformam suas comunidades por meio da arte e da cultura.
Ao lado de Graicy Karen, de Mossoró, finalista na categoria Mulheres com o projeto Ébanos Tranças, Aisha representa o Rio Grande do Norte na premiação. A votação popular está aberta até o dia 10 de novembro, e pode ser feita pelo site do Instituto Neoenergia.
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