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Moradora da periferia de Campinas (SP), a travesti Puma Camillê, de 29 anos, também relata percalços até descobrir um lugar onde se sentisse pertencida, processo que se deu por meio da capoeira e da dança. Antes, ela conta que sofria pressões para se encaixar no gênero masculino.
No Dia da Visibilidade Trans, celebrado neste domingo (29), Paolla e Puma detalharam ao g1 as dificuldades e conquistas presentes em suas histórias. Além disso, enfatizaram a importância de visibilizar, além das demandas reivindicadas pela comunidade LGBTQIA+ em geral, as reivindicações específicas das pessoas trans.
'Ele abandonou a família porque eu era LGBTQIA+'
Paola Bathory, de 31 anos, é trans e reside em Sumaré (SP) — Foto: Arquivo pessoal
Paolla é uma mulher trans que nasceu em Bom Jesus do Tocantins (PA), começou a trabalhar aos 12 anos e precisou deixar a casa da mãe para ir em busca de emprego enfrentando a transfobia do mercado de trabalho: “tive que encontrar maneiras de me sustentar fora do mercado de trabalho. Vendendo produtos de beleza, saindo de porta em porta”.
A primeira parada de sua trajetória foi Brasília (DF), onde trabalhou como caixa em uma rede de supermercados. Ela conta que, mesmo buscando cursos de qualificação, não conseguia ascensão profissional por conta da identidade de gênero. Paolla diz que, na oportunidade, foi taxada de “espetaculosa” e “muito colorida”.
Paolla Bathory fala sobre dificuldade de pessoas trans para conseguir emprego
Frustrada, a gestora voltou para a casa da mãe, no interior do Pará, antes de decidir se arriscar na maior metrópole do país. “O povo fala que São Paulo é bom de emprego, São Paulo é movimentado, é a metrópole que nunca dorme”, relembra.
Chegando a Santo André (SP), na Região Metropolitana de São Paulo, ingressou em um curso de maquiagem, mesmo sem gostar. Sobre a situação, Paolla lamenta a resistência do mercado de trabalho a mulheres trans.
Paolla Bathory revela caso de transfobia com cabeleireiro
Foi nessa situação que Paolla viu a oportunidade de voltar a trabalhar com produtos de beleza e se mudou para Sumaré. Na cidade do interior paulista, conquistou um cargo de liderança na empresa na empresa de cosméticos e conseguiu sua independência financeira, passo que revela ter sido fundamental para ser reconhecida.
“É um passo importantíssimo. Recuperei minha dignidade. Você sabe o que é olhar e não poder comprar? Você estar sempre no vermelho? Então isso é maravilhoso para mim”.
Paolla Bathory fala sobre o combate à transfobia
Puma Camillê, de 29 anos, é comunicadora e artista multicultural — Foto: Arquivo pessoal
Nascida no bairro Fundação Casa Popular, em Campinas, Puma Camillê, de 29 anos, é comunicadora, artista multicultural e usa as palavras "travesti, preta e retinta" para definir a si mesma. Diferentemente de Paolla, ela conta que a família esteve ao seu lado durante o processo de se descobrir travesti e ofereceu o afeto que precisava para passar por períodos difíceis.
Nas rodas de capoeira convencionais, Puma conta que lhe era cobrada uma masculinidade que ela nunca conseguiu atender.
Puma aprendeu a se a expressar através de uma manifestação que une a capoeira com a dança Vogue - estilo criado por mulheres trans e travestis com movimentos corporais definidos por linhas e poses -, frequentando batalhas de performances artísticas entre o público LGBTQIA+, as chamadas ballrooms.
"Era uma roda onde todo mundo batia palma, onde tinha uma maestria julgando aquilo, instrumentos, música, canto e retorno, tinham duas pessoas no meio da roda chutando e girando, eu achei que era capoeira. Quando eu cheguei perto, vi que tinha gente de salto, eram travestis. Eu achei o máximo e vi que isso de alguma forma isso também vibra dentro de mim", explica.
Ao descobrir o Vogue, pensou que poderia criar algo que unisse as duas práticas que se complementavam dentro dela. Em 2019, criou o coletivo "Capoeira para Todes" com intuito de construir um espaço para fazer o que amava, de respeito às diferenças e de acolhimento entre os membros, que, em muitos casos, foram expulsos de casa.
No Dia da Visibilidade Trans, Puma Camillê ressalta que ser travesti não quer dizer ter uma forma única de se manifestar.
"Traz possibilidades de existências fora da fora da binariedade, pois há imensa gama de possibilidade de manifestação de gênero."
Segundo ela, o caminho para viver de forma harmoniosa com a diversidade de gêneros passa por representação política, informação e o acesso de mais pessoas trans aos diferentes espaços da sociedade.
Puma Camillê, de 27 anos, reside em Campinas — Foto: Arquivo pessoal
*Sob supervisão de Fernando Evans e Helio Carvalho