Por uma Universidade Travesti

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A Universidade Estadual de Londrina aprovou, em suas instâncias deliberativas, entre o final de junho e início de julho, a criação de um Grupo de Trabalho para avaliar a possibilidade de implementação de cotas para pessoas trans, travestis, transmasculinas e não binárias em seus processos seletivos.

Há 20 anos, esta mesma Universidade deliberava sobre a implementação de cotas raciais e, à medida em que os anos passam, temos visto, cada vez mais, pessoas negras ocupando os assentos da academia.

Isso produz não apenas uma mudança numérica, mas uma alteração na própria noção e percepção desta instituição. Suas produções, suas contrapartidas sociais e sua própria posição na sociedade londrinense deslocam-se, inevitavelmente, ampliando um olhar crítico às dinâmicas raciais.

As populações negras e suas demandas passam a ser percebidas, notadas. Ocupam espaços físicos, mas também assumem lugar no imaginário de toda população.

Em paralelo, pensemos: onde se encontram as pessoas trans de nossa sociedade? Muites se encontram no subemprego, no acesso negado à saúde, ao trabalho, à cidade. Tratades como criaturas, estranhades ao trafegarem pelos espaços comuns, não raro são motivo de piadas e, em muitos casos, de violências explícitas contra nossas integridades físicas.

Tudo isso tem relação direta com os processos de exclusão que, mais que institucionais, são imaginativos: é muito provável que você não esteja costumade a ver uma pessoa trans no seu dia a dia, exatamente porque não convive conosco e acredita que somos de outro mundo. Não somos! Trabalhamos, pagamos impostos, somos também parte da cidade.

Desta forma, convocar a discussão sobre cotas para pessoas trans é reivindicar o direito de existirmos. É estratégico pegar uma população da qual, segundo estimativas, somente 0,02%, ou seja, 2 pessoas em 10.000, conseguem acessar o Ensino Superior, e declarar que haverá um espaço reservado para estas pessoas, enfrentando efetivamente a marginalização.

Isso não tem a ver com privilégios. Também não se trata de desqualificar as capacidades destas pessoas. É reconhecer que uma série de acordos sociais implícitos lhes nega o acesso, estabelecendo assim novos acordos sociais, estes agora explícitos, discutidos e expressos, garantindo a possibilidade do estudo.

Nos últimos anos, com cada vez mais universidades pelo Brasil avaliando a implementação destas cotas, mais dados têm sido produzidos e mais exposta fica a realidade de exclusão de pessoas trans, travestis, transmasculinas e não binárias dos espaços universitários. Mas tal exclusão não é difícil de ser constatado: vá à UEL e observe quantas pessoas destas populações encontrará por lá.

Diante desta realidade explícita, resta à Universidade Estadual de Londrina a impossibilidade de se manter neutra. Ou reconhece a pertinência desta discussão, e busca implementar uma política eficaz de acesso e permanência para nossos corpos OU admite seu descompromisso com a diversidade e com os valores constitucionais de pluralidade e dignidade da pessoa humana.

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Ursula Boreal Lopes Brevilheri

Travesti não binária, cientista social, mestra e doutoranda em Sociologia, ativista de direitos humanos.

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