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No Mês do Orgulho LGBTQIA+, celebrado anualmente em junho, a dúvida de muita gente se concentra na “sopa de letrinhas” que não para de crescer. A evolução da sigla para designar diversas minorias sexuais e de gênero é uma resposta ao tamanho do espectro e das demandas da comunidade composta por lésbicas, gays, bissexuais, travestis, trans, pansexuais, agêneros, pessoas não binárias e intersexo por mais visibilidade.
É bom frisar que o acrônimo, para alguns, pode ser apenas letras, mas o intuito é que um número cada vez maior de pessoas se sinta representada pelo movimento e as suas pautas defendidas na sociedade. Cada letra representa um grupo de pessoas que sofre diferentes tipos de violência simplesmente pelo fato de não se adequar àquilo que foi definido como sendo o “normal” na sociedade.
Na primeira sigla criada em 1994, GLS, o “S” representava os simpatizantes, pessoas aliadas à causa LGBTQIA+. Mas logo o acrônimo se mostrou ultrapassado e excludente porque deixava de fora as demais identidades.
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A grande mudança na sigla ocorreu, depois, com o “L” passando a encabeçar a sequência de letras para dar mais visibilidade às demandas de mulheres lésbicas. A abreviação também ganhou o “B”, para bissexuais. O “Q” (“questionando”, para uns; “queer”, termo genérico antes pejorativo, para outros) também surgiu, e o amontoado de letras continua a crescer.
SEXUALIDADE
A sexualidade humana é um tema que gera polêmicas e muitas controvérsias, uma vez que envolve questões afetivas, papéis esperados e desempenhados em uma sociedade, além do comportamento. De forma geral, ela envolve quatro aspectos.
O primeiro é gênero, que corresponde ao sexo da pessoa. Assim, temos o sexo feminino e o masculino. O segundo é a orientação sexual. Ela diz respeito à atração que se sente por outros indivíduos. Ela também envolve questões sentimentais, e não somente sexuais. Assim, se a pessoa gosta de indivíduos do sexo oposto, falamos que ela é heterossexual (ou heteroafetiva).
Se a atração é pelo mesmo sexo, sua orientação é homossexual (ou homoafetiva). Há também aqueles que se interessam por ambos: os bissexuais. Há, ainda, os assexuais, aqueles que não sentem atração sexual, e os pansexuais: pessoas cuja identificação com o outro independe de seu gênero, orientação, papel e identidade sexual.
É mais adequado dizer homoafetividade do que homossexualidade; assim como heteroafetividade em substituição ao termo heterossexualidade, e assim por diante. Isso porque o sufixo sexual tende a compreender que essas relações se reduzem unicamente a tal aspecto (o sexual), o que não pode ser utilizado como regra.
Quanto ao termo “homossexualismo”, cada vez mais em desuso, ele é incorreto, uma vez que o sufixo “ismo” sugere que essa orientação sexual é uma doença, o que não é considerado verdade e trata-se de um preconceito.
Quanto ao terceiro aspecto, o papel sexual, este está relacionado ao comportamento de gênero que a pessoa desempenha na sociedade. Ele não necessariamente se apresenta relacionado à orientação sexual, tal como a priori possa parecer. Assim, um “homem másculo” pode ter atração por outros homens (orientação homo, bi ou pansexual), embora seu papel sexual mostre o contrário.
Por fim, temos o quarto aspecto: a identidade sexual, que é a forma como o indivíduo se percebe em relação ao gênero que possui. Quando a pessoa de determinado gênero se sente mais como se fosse de outro, independentemente de sua orientação sexual (às vezes até mesmo de seu papel sexual), falamos que ela é transexual. Pontualmente falando, transexual seria aquele cuja identidade sexual não é a mesma que seu sexo biológico; sendo normalmente aquele que recorre a tratamentos hormonais e/ou mudança de sexo.
Os termos trans, transgênero – atualmente em desuso – e transexual podem ser utilizados tanto para identidades masculinas, quanto femininas. Já o termo travesti é utilizado apenas para pessoa trans com identidades femininas.
Atitudes continuam a mudar, e a linguagem para orientação sexual e identidade de gênero também. A reportagem do CORREIO, a título de informação e inclusão, conversou com um representante marabaense da comunidade, acerca de sua experiência e vivência.
Nascido e criado em Marabá, João Erikson, 27, conta que, diferentemente de algumas pessoas, ele sempre se sentiu parte da comunidade: “Desde que me entendo por gente, me vi dentro do corpo social LGBT. Muitos acreditam que se trata de uma opção, uma escolha, mas eu entendo que a gente já nasce assim. Não dá para querer escolher. Entretanto, se entender como alguém gay é algo complexo, demanda um tempo, apesar de você saber que não é como as outras pessoas héteros”, explica o vendedor.
PRECONCEITO
O jovem abriu o coração na reportagem e falou sobre o preconceito vivido desde sempre por ser quem é. Desde a infância, João se viu com dificuldade de seguir padrões, mas as coisas se tornaram mais difíceis durante a adolescência com o bullying por parte dos colegas de escola. No trabalho, ele explica que não é muito diferente: “A discriminação acontece por parte dos clientes. Pessoas já se recusaram a ser atendidas por mim, por me observar e prejulgar que eu não seria hétero”, diz.
Apesar da naturalidade com que ele fala sobre os desafios sofridos, basta se colocar no lugar de João para entender que não é fácil ser excluído e sofrer violências de diversos tipos apenas por não fazer parte de um padrão criado e imposto pela sociedade.
“A gente espera não encontrar esse tipo de coisa atualmente, mas vemos todos os dias que isso continua a acontecer. E não só comigo, já vi acontecer com outras pessoas do meu próprio trabalho também”, relata, ao lembrar de situações em que colegas foram agredidos verbalmente e clientes se recusaram ser atendidos por estes, apenas por trejeitos ou características físicas que remetem à comunidade.
ORGULHO
João entende que ser LGBTQIA+ é uma imposição pessoal que necessita ser feita o tempo todo. Algo que sempre está presente no inconsciente, devido às discriminações e à intensidade que é viver uma vida repleta de imposições, obstáculos e perigos, levando em consideração os altos índices de violência sofridas pelo corpo social.
No entanto, o jovem vendedor sente orgulho de ser quem é. Ele ressalva que se fosse uma escolha, nasceria gay novamente: “Como tudo na vida tem a parte ruim, fazer parte da comunidade também tem seu lado prazeroso”, aponta, ao citar que possui grandes amizades no meio que está inserido. Se sente acolhido.
Além de tudo, João considera que estar na posição atual o ajuda a ter pensamentos mais progressistas como ser humano. Ele elucida que todas as situações pelas quais passou, o fizeram compreender a necessidade de uma sociedade mais inclusiva, para todos.
A respeito do Dia Internacional do Orgulho LGBTQIA+, ele crê que a data é imprescindível para mostrar a todos a importância da causa, para que constantemente haja a luta pelos direitos e o lugar de fala de todos, independentemente de sua orientação sexual, gênero, raça, classe, entre outras diversidades presentes no mundo.
MARABÁ E A DIVERSIDADE
De acordo com João, Marabá já foi uma cidade mais engajada no movimento, e que abraçava mais a comunidade. Para o jovem, o município peca nesse sentido devido à falta de pessoas referenciais: “Hoje em dia, já não vemos tantas pessoas que nos representem mais. A comunidade sente falta desse abraço mais apertado”. Todavia, ele reconhece que existem grupos que não deixam a chama apagar, como por exemplo, a organização da 12ª Parada LGBT.
“O que falta de verdade é o engajamento na política. Muitos se preocupam apenas com redes sociais e esquecem da necessidade de se organizar para a criação de políticas públicas que abrangem o corpo social”, critica. Para ele, houve um tempo em que essas questões eram mais priorizadas no município.
PESSOAS TRANS
Para finalizar, o vendedor sente a necessidade de deixar uma mensagem em nome de todos os LGBTQIA+ de Marabá. O jovem pondera sobre o acolhimento de pessoas trans, não somente pela sociedade como um todo, mas pela própria bandeira, devido ao grande sofrimento vivido por tal grupo.
Dados do Dossiê Assassinatos e Violências Contra Travestis e Transexuais Brasileiras em 2021 apontaram que no ano passado, foram registrados 140 assassinatos de pessoas trans no Brasil. Deste total, 135 tiveram como vítimas travestis e mulheres transexuais e cinco vitimaram homens trans e pessoas transmasculinas.
O número foi menor do que o do ano anterior, quando foram registrados 175 assassinatos de pessoas trans. Mas foi superior ao de 2019, no período pré-pandemia, quando foram contabilizados 124 óbitos. O número de 2021 está acima da média desde 2008, de 123,8 homicídios anuais de pessoas pertencentes a esse segmento.
“Infelizmente, a discussão vai para além do respeito. Pessoas trans precisam ter o direito de existir. Esse grupo é extremamente marginalizado e muitas das vezes excluído dentro até mesmo da bandeira”, explica João, asseverando que embora não seja seu local de fala, utiliza dele nesta reportagem para chamar a atenção da sociedade para urgência que é deixar pessoas trans viverem e serem o que são. (Thays Araujo)