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Um doutorando da Universidade de Brasília (UnB) ganhou um prêmio por um ensaio fotográfico que registrou o cotidiano de uma travesti quilombola, que vive na comunidade Surubiu-Açu, no interior do Pará. Lourival de Carvalho, de 31 anos, é doutorando em direito, estado, e constituição e, por meio da academia e da câmera, decidiu contar a história de Jade.
Ao g1, o estudante contou que o interesse pelo tema surgiu ainda na graduação, em 2012, quando ele fez uma pesquisa sobre direito à educação superior na experiência de pessoas trans.
Depois, no mestrado, ele decidiu se debruçar sobre comunidades rurais do Piauí. O objetivo era entender a diferença entre a cena LGBTQIA+ nas grandes metrópoles e no campo.
"Quando estava em Brasília, estudando, me falavam que, ao visitar comunidades rurais, eu iria para o vespeiro da homofobia. Porém, tive outra percepção daquele espaço, vi um olhar com menos fúria e menos preconceito".
A própria vivência de Lourival reforçou esse aspecto. "Meu avô é vaqueiro e mora no interior. Ele foi o único membro da minha família que não me descriminou", comentou o estudante, que é gay.
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Ensaio fotográfico de Jade, travesti quilombola do Pará, venceu prêmio — Foto: Lourival de Carvalho
Em 2016, em uma conversa com amigos, ele soube da existência de Jade. A procura para chegar até ela, teve ajuda de um antropólogo peruano.
Travesti quilombola Jade foi registrada pelo doutorando da UnB Lourival de Carvalho — Foto: Lourival de Carvalho
No doutorado de Lourival, a pesquisa é sobre direito à diferença. Em 2020, o pesquisador conseguiu o contato da travesti, mas chegar até ela exigiu persistência.
Decidido, ele enfrentou a falta de transporte, a falta de investimentos em internet e ainda a pandemia da Covid-19 para encontrar Jade, que mora em uma região de difícil acesso.
Doutorando Lourival de Carvalho e Jade terminaram amigos após experiência — Foto: Lourival de Carvalho
Mesmo com as dificuldades, o estudante diz que a experiência com Jade foi outro prêmio. Ela tem 55 anos, 20 anos a mais do que a expectativa de vida de uma transexual ou travesti no Brasil.
Na comunidade, ela trabalha com agricultora, apicultura e pesca. Além disso, atua como "consertadeira", uma função de respeito no lugar, baseada em técnicas de massagens e benzeduras em moradores que sofrem com dores musculares.
Doutorando da UnB Lourival de Carvalho é premiado após fazer ensaio de Jade, uma travesti quilombola que vive no Pará — Foto: Lourival de Carvalho
O direito de pertencer a uma comunidade que respeita as diferenças é negado à maioria das travestis em grandes metrópoles, pontua o pesquisador. Por isso, a trajetória de Jade é o tema do doutorado de Lourival.
Doutorando da UnB Lourival de Carvalho registrou cotidiano da travesti Jade, no Pará — Foto: Lourival de Carvalho
Lourival foi três vezes à comunidade e, ao todo, ficou 23 dias hospedado na casa de Jade. O resultado, foram mais de mil fotos.
Com as imagens, ele montou a obra "Quilombismo travesti", que ganhou o Prêmio Ana Galano de melhor ensaio fotográfico de 2021, no 45º Encontro da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Ciências Sociais (Anpocs). "Fiquei muito feliz. Foi o primeiro ensaio da minha vida".
Ensaio de Lourival de Carvalho foi exposto na comunidade paraense — Foto: Lourival de Carvalho
O ensaio virou exposição na comunidade, com as fotos amarradas em uma rede de pesca, decorada com girassóis. As imagens foram expostas com prendedores de roupa e distribuídas no final da mostra.
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