ARTICLE AD BOX
Nesta sexta-feira (23), Dia da Visibilidade Bissexual, o g1 conversou com três homens bissexuais para entender de que forma eles lidam com a bifobia – preconceito e discriminação contra bissexuais – e com a cobrança da virilidade masculina. O professor universitário Seu Vérciah também foi entrevistado e falou sobre o conceito de masculinidade frágil.
O psicólogo Felipe Viterbo, de 27 anos, percebeu que sentia atração por homens e mulheres ainda na adolescência, mas pela falta de representatividade tentava entender em que orientação sexual se encaixava.
Por volta dos 19 anos, quando estava na faculdade, o psicólogo descobriu que existia nome para o que sentia e entendeu que era bissexual.
O publicitário Roberto Junior, de 28 anos, tem uma história de descoberta semelhante com a de Felipe Viterbo. Ele também se identificou como bissexual na época da faculdade.
Estudante Kaio Vasconcellos — Foto: Reprodução/Redes Sociais
Já o estudante Kaio Igor Vasconcellos, de 25 anos, percebeu sua sexualidade por volta dos 16, antes mesmo de se identificar como um homem trans.
A identidade de gênero e a orientação sexual são temas diferentes e facilmente confundidos na sociedade:
- Identidade de gênero tem a ver como uma pessoa se identifica: cisgênero, trans, travesti, não binário, queer, entre outros;
- Enquanto a orientação sexual tem a ver com a forma como as pessoas se atraem pelas outras. Elas podem ser heterossexuais, gays, lésbicas, bissexuais ou pansexuais.
Psicólogo Felipe Viterbo — Foto: Reprodução/Redes Sociais
Outro ponto citado pelos entrevistados é a dificuldade para se relacionar com mulheres, conforme detalhou Felipe Viterbo.
"Quando ia me relacionar com mulheres, eu falava logo no primeiro encontro que era bissexual, porque era importante deixar isso claro. Algumas mulheres demonstravam resistência, elas travavam, a conversa começava a ficar estranha".
O publicitário Roberto Junior relatou que já foi preterido por mulheres apenas pelo fato de ser bissexual.
"Há essa invalidação [da bissexualidade]. Já ouvi de mulher que ela não ficaria com bi, porque homens bissexuais beijam homens também. Acho que elas não acreditam [nessa orientação sexual] ou não se sintam à vontade pelo fato de eu ficar com outros homens", detalhou.
Invisibilidade e deslegitimação
Bandeira LGBT — Foto: Pixabay
Apesar da bissexualidade ser uma orientação sexual tão válida quanto as demais, ainda há muita invisibilidade no que diz respeito a essa sexualidade.
Leia também:
De acordo com relatos de pessoas bissexuais, elas acabam sendo associadas à promiscuidade e infidelidade, já que se atraem por homens e mulheres. A bifobia ocorre tanto no meio heterossexual, quanto na comunidade LGBTQIAP+, conforme explicou Roberto Junior.
Ao g1, o publicitário detalhou que desconfiou da própria sexualidade por causa da bifobia.
“Apesar de tudo, consegui sair dessa caixinha homo/hétero que queriam me colocar e pude me compreender enquanto bissexual. Entendi que não precisava escolher, porque sinto atração por homens e mulheres”, disse.
Já o estudante Kaio Vasconcellos disse que, na maioria das vezes, é visto como heterossexual. Quando ele afirma ser bissexual, as pessoas ficam em choque.
Performance de gênero e masculinidade frágil
Performatividade de gênero e masculinidade tóxica — Foto: Reprodução/Freepik
A performance de gênero está relacionada ao fato como uma pessoa se comporta em sociedade, com base no que é imposto às mulheres e homens por causa do sexo biológico.
Conforme a escritora nigeriana Chimamanda Ngozi Adichie, a maneira como os meninos são educados na infância é nocivo. Em seu livro "Sejamos Todos Feministas", a autora destaca que as crianças do sexo masculino são ensinadas a reprimir os sentimentos e não demonstrar vulnerabilidade.
Já em relação à masculinidade frágil, o professor universitário Seu Vérciah detalhou que esse conceito é processado e forjado a partir da própria estrutura do machismo.
"Como homem trans, a partir do momento em que tomei consciência de minha masculinidade, passei a observar o 'sujeito homem'. Nessa observação — que parte aliás, de uma questão que me foi lançada por uma amiga: 'que homem você quer ser?' —, percebi essa 'masculinidade frágil'", disse.
Seu Vérciah, pesquisador sobre masculinidade — Foto: Arquivo Pessoal
Na maior parte das culturas no mundo, os homens vivem com mais liberdade, poder e ascensão que as mulheres. Segundo Seu Vérciah, isso ocorre porque diferentes sociedades legitimam essa situação, por terem o machismo como base estrutural.
"Entretanto, da mesma forma que, socialmente, homens gozam de variados 'sins', acabam tendo que aprender a viver sob vários 'nãos': não pode usar brinco, nem ter amizade com pessoas LGBTQIA+, porque deixará de ser homem; não podem chorar, nem demonstrar os momentos de fraqueza, porque isso reduz sua masculinidade; precisam se sobrepor e diminuir suas companheiras, porque não conseguem lidar com o sucesso delas, já que foram educados para serem superiores às mulheres", detalhou.
Para Felipe Viterbo, essa cobrança de performance masculina sempre esteve presente em sua vida. Ele relatou que já se comportou de um jeito "afeminado" para se encaixar no meio LGBTQIAP+, bem como tentou mostrar mais virilidade quando estava na companhia de homens heterossexuais.
“Atualmente eu performo uma masculinidade que não é máscula e típica do homem padrão, mas também não me considero afeminado”, pontuou.
Publicitário Roberto Junior — Foto: Reprodução/Redes Sociais
Já Roberto Junior disse que foi educado desde pequeno a falar "grosso", a não andar rebolando, nem cruzar as pernas ao sentar.
"Isso é muito complicado, porque a sociedade ensina que os homens devem agir dessa forma", relatou.
Para mudar essa realidade, o pesquisador Seu Vérciah afirmou que a sociedade precisaria discutir de forma séria o machismo. "Não basta criar leis, pois a Lei Maria da Penha está aí há anos e mesmo assim mulheres (cis e trans) são mortas ou sofrem diversos tipos de violência, apenas por serem mulheres", disse.
Veja mais notícias do estado no g1 Bahia.